sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Os insectos cinzentos

Capitulo I- 1ªparte

Miguel

A minha família e eu não somos próximos.
Isto não seria estranho de dizer não tivesse eu treze anos de idade e tivesse vivido sobre o mesmo tecto que eles toda a minha vida. Mas é a mais pura das verdades, não somos próximos.
A minha mãe, uma ex-hospedeira de 43 anos, que agora tem um cargo administrativo na TAP, nunca exigiu nada menos do que excelência dos seus filhos e eu, como um pequeno rapaz de 13 anos que não tem particularmente boas notas e é um desportista apenas razoável não preencho os requisitos. Acho que ela culpa o meu pai pela maneira como eu e a Joana saímos, mas ainda está a ver se eu me componho. Custa a acreditar que a minha mãe, tão bonita (uma mulher de 43 anos, sem negar, mas muito bonita) e tão inteligente, se tenha interessado por um falhado como o meu pai.
Bem, ele nem sempre foi assim, acho eu… A Sandra diz que ele costumava ter um emprego e cabelo e ganhar muito dinheiro mas, pouco depois de eu nascer, o banco onde trabalhava faliu. A mãe ganha o bastante para nos sustentar mas não para levar a vida que levamos, só que os meus avós, um ex-ministro e economista e uma professora reformada que toma chá com a Lili Caneças, dão-nos o dinheiro suficiente para podermos viver de uma maneira que a maior parte das pessoas não vive. Bom, a partir daí o meu pai começou a acumular os anos sem emprego, o teor alcoólico por dia e os quilos a mais até se tornar na confusão careca, gorda e inútil que está presentemente a ocupar o nosso quarto das visitas (a mãe há muito que o expulsou do dela, mas não se quer divorciar do pai pois não gosta de se ver como divorciada, o pai é uma fachada, mas uma fachada agradável).
Não me aproximo da minha mãe porque ela não tem tempo para essas coisas e tem menos instinto maternal que… Bem, sabem aqueles animais que comem as crias que nascem deficientes? A minha mãe ainda só não comeu a Joana porque os vizinhos iam pensar mal dela.
A única filha de que realmente toma conta é a Sandra, pois ela é uma oportunidade para projectar os seus sonhos e aspirações falhadas.
Já o meu pai… Não sou próximo do meu pai, porque não tenho pai, porque quem quer que seja aquela carcaça nojenta que às vezes se arrasta até á mesa para jantar connosco, nunca pode ter sido pai de ninguém, quanto mais o meu…O meu pai há muito que abandonou o seu corpo e deixou aquele parasita que nada mais faz do que comer, beber e dormir.
-Miguel, acaba o teu sumo, não queres chegar atrasado. – disse a minha irmã Sandra na sua voz altiva. A Sandra, oh, a Sandra. A Sandra anda no 12º ano faz ballet desde os três anos, equitação desde os oito e natação desde os três… meses.
É alta e magra, pálida como eu, com o cabelo castanho-escuro como o meu, e os olhos grandes da mesma tonalidade escura que os meus. No entanto, o nariz pequeno e triangular no meio dos olhos enormes e escuros, a forma oval da cara, o queixo saído e a boca pequena e redonda dão-lhe o aspecto de um pássaro qualquer que não consigo identificar. Na minha modesta opinião, está bem longe de ser bonita e tem sem duvida um ar sonso, mas segundo a Joana, alguns rapazes acham piada e a cara de pássaro consegue ser interessante.
Claro que dezassete anos de perfeccionismo, pressão, maus-tratos emocionais e défice de carinho tornaram a Sandra em alguém com quem é realmente desagradável de se estar. Ela é completamente perfeccionista, obsessiva, sonsa, insegura (mas compensa-o fazendo os outros sentirem-se ainda pior que ela) e consegue ser realmente vingativa e cruel, sendo no entanto leal a quem a ajuda. Toda a gente quer estar nas boas graças da Sandra. Com esta descrição talvez seja difícil de acreditar que ela tenha tantos amigos mas a Sandra tem um jeito especial para manipular, assustar e ostracizar as pessoas e como é uma intrometida que tem a mania que é boa as pessoas pensam que isso é verdade. Um bocadinho como um ditador, a Joana diz que a grande inspiração dela é o Hitler, que não sabe porque é que ainda continua a tirar o bigode. A vida amorosa dela também não vai mal porque apesar de a maior parte dos rapazes não gostarem de ser tratados como cães por uma maluca obsessiva, ela é atraente e tem talento para te obrigar a fazer aquilo que quer.
-Joana, por amor de deus, despacha-te! Se não quiseres comer não comas, deus sabe que não precisas, mas por amor de deus não te tornes um estorvo ainda maior do que já és ao fazer-nos chegar atrasados.
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Continua na 2ª parte

1 comentário:

Adoriabelle disse...

Like nisto!!!!!!!!
Next parte!