sexta-feira, 6 de julho de 2012

Adeus

Terça-feira, 14 de agosto de 2011
Querido Mário:
São quatro da manhã e eu não consigo dormir. Muito típico de mim, como sabes. Com isto, decidi responder à carta que mandaste há uns meses e, sinceramente, não percebi o motivo de o teres feito. Poderia mandar-te uma carta a dizer que podemos ser amigos, mas estaria a ir contra os meus princípios, portanto não o farei. Assim mando-te esta carta mostrando a minha opinião. Não gostei do que fizeste. Deixaste-me, depois de tudo o que passamos juntos. Não te desejo mal. Mas se o nosso amor tivesse sido apenas um caso de anos, podes ter a certeza que não era a felicidade que te desejaria. Quando esta carta te chegar às mãos perceberás que tenho um vazio que não pode ser preenchido. Não te amo. Esqueci-te porque sei que mais tarde ou mais cedo terás alguém junto de ti. Não são ciúmes. É desprezo, vergonha. Desprezo da pessoa que irá preencher o meu lugar no teu coração. Vergonha por ainda não ter casado. Os sentimentos que demonstro aqui podem ser um pouco contraditórios, por isso, quero pedir-te que não me escrevas mais. Nem sequer te dês ao trabalho de responder a esta carta. Será inútil. Não voltes cá a casa. Apaga o meu número de telemóvel por favor. Eu já apaguei o teu. Por fim, quero que saibas que não foste só um namoro. Ajudaste-me. Contigo percebi que não posso agarrar-me demasiado as pessoas, senão enlouquecerei. Digo isto porque penso que é isso que me está a acontecer. Acabo esta carta com lágrimas no papel. Não sei a razão. Mas hei-de descobrir e então encontrarei alguém que me faça feliz. Adeus.
Lúcia
Adoriabelle

domingo, 29 de abril de 2012

O Lado negro da Lua


No início do nono ano a minha turma teve uma nova aluna. Chamava-se Lua* e era alta, linda, atlética e virtuosa. Céus, nós odiávamo-la.

            Não era que ela fosse simplesmente bonita, ela era linda, tinha a altura perfeita, o peito grande em oposição ao corpo magro, o cabelo castanho claro até á cintura e aquela cor de olhos ambarina, entre o verde e o castanho, quase amarelada que superava todas as outras cores e as fazia envergonhar-se da sua simplicidade. Era por isso que todas a odiávamos, porque ela era tudo o que a sociedade á nossa volta afirmava que devíamos ser. Teria sido muito mais fácil se ela não soubesse desenhar tão bem, tão bem que a nossa professora de EV a preferia acima de todos os restantes alunos e lhe dedicava um carinho especial. Podia até ter sido suportável se ela não tivesse encantado os espectadores do Sarau de Natal, quando tocou piano para acompanhar os poemas que o rebanho constituído pela minha turma recitou, se os olhos do público não se tivessem fixado na seda macia do cabelo dela em vez de nos nossos olhos indiferentes ao ler poesia que para nós nada significava podíamos ter aceitado a chegada dela.

E que chegada essa! No primeiro dia do ano, da primeira vez que a vi, bronzeada, de roupa florida e cintilante apercebi-me, e penso que não fui a única, que ela não era uma de nós. Para mim, as raparigas e rapazes do colégio sempre tiveram uma constituição especial, débil, frágil, peculiar, de certo modo até doentia. Ela não era assim, era musculada e sólida, cada uma das suas feições irradiava saúde e alegria e até a maneira como se apresentou, como vociferou aquele nome, Lua, três letras apenas, sempre sem parar de sorrir e de erguer os olhos místicos para o interlocutor era diferente da nossa arrogância contida.

Apesar de tudo, apesar de tudo isso, penso que até tive sorte. Ela era mais bonita, mais talentosa, mais atlética e infinitamente mais simpática do que eu mas eu escrevia melhor. Lembro-me de uma aula em que, depois de a Lua ter lido um texto mediano eu apresentei o meu e, embora reconheça agora que a história não mereceu os elogios que acarretou, esse incidente garantiu-me que ela não era melhor do que eu em tudo. Eu não perdera a minha identidade, ainda tinha o meu talento particular, aquilo que tornava única.

Infelizmente, isso não aconteceu com todas nós e que melhor exemplo disso do que o incidente do balneário? Havia uma rapariga que eu conhecia desde o quinto ano, uma rapariga chamada Purpurina*, com a qual a minha relação complicada merecia um texto autónomo e, por esse mesmo motivo, não vou falar dela mais do que o necessário. O único facto que é realmente necessário saber acerca dela é que era uma galdéria. Não julguem que estou a ser cruel, posso apenas imaginar os motivos que a fariam comportar-se dessa maneira, de facto, nem sequer sei até que ponto ser uma galdéria é realmente moralmente condenável mas a verdade é que esse era o seu traço mais óbvio. Portanto, as tardes antes de Educação Física, quando ela mostrava as fotografias eróticas que uns falhados lhe enviavam, eram os momentos de glória dela, os seus 15 minutos de fama. O falhado desta semana era um rapaz normal, nem sequer particularmente atraente, só um miúdo:

-Já olhas-te bem para este corpo, ele não é mesmo bom?

-Achas isso um bom corpo? – Disse a Lua antes de mostrar uma fotografia de um rapaz musculado, esse sim, realmente atraente, que conhecera no ginásio.

            Escusado será dizer que a Purpurina nunca mais conseguiu manter a ilusão de a suportar. Raramente a criticava, até porque isso não era possível, não havia nada para criticar, limitava-se simplesmente a gozar com a voz da Lua e a encolher sarcasticamente os ombros cada vez que o nome dela era mencionado. Claro que o facto de o Gato, o namorado da Purpurina estar sempre a admirar e assediar a Lua (eu estou convencida que ele estava apenas a tentar assegurar a sua sexualidade ao mundo, especialmente a ele próprio, embora não considere que tenha feito um trabalho brilhante) não ajudou a melhorar a relação. Nunca ocorreu á Purpurina que a Lua não podia querer saber menos do namorado dela e que o Gato fazia aquelas coisas em parte para fazer ciúmes á namorada infiel que, homossexual ou não, ele adorava.

Quanto ás minhas próprias experiências com a Lua, nunca encontrei uma única razão lógica para a odiar, Ela nunca foi menos do que amorosa comigo. Nem uma palavra fria, nem um ato mesquinho, nem nenhuma daquelas maldades involuntárias características da raça humana, nada. Ajudava-me em Educação Física e cantava Whitney Houston comigo nas traseiras da escola, sem vergonha daquela musica tão diferente das melodias baratas da cidade Fm que a generalidade das raparigas da minha turma ouviam (calorosamente denominada pelos rapazes da nossa turma de “música de gaja”).

Mas, na realidade, só tive uma conversa honesta com ela a poucos dias do fim do ano, sentada nas escadas das traseiras, com o sol a bater-me na cara e um sentimento precoce de nostalgia, como se já tivesse passado por tudo aquilo, há muito tempo, numa outra vida. Foi nessa conversa, descontraída, despretensiosa e interessante que descobri que a Lua fazia parte, juntamente com a minha colega Azul e as respetivas famílias de cada uma, numa seita que cria na existência do diabo e da reencarnação, que tinha estado, durante a infância, tão obcecada com a possibilidade de ser raptada que se recusava a sair de casa quando não escoltada por um carro e coberta de casacos e que nunca usava camisolas de manga cavada porque odiava os seus ossudos, longos e perfeitos braços. Mas acima de tudo, descobri algo que fez com que a identificasse comigo. A Lua queria pintar, era tudo aquilo que queria para o futuro dela mas a insegurança acerca de ser ou não talentosa o suficiente fizera com que declarasse á família o desejo de seguir a arquitetura como profissão, o que a desagradava profundamente. Percebi nesse momento que a Lua, que era melhor do que todos a tudo, tinha medo de não ser boa o suficiente na única coisa que realmente lhe interessava e que isso estava a corroê-la. A Lua era estranha, insegura, frustrada, bela e fascinante como qualquer outro ser humano e torna-la perfeita era tão insultuoso e prejudicial para mim como para ela, para ela porque não se pode compreender e ajudar alguém enquanto os consideramos anjos de uma dimensão diferente e para mim porque a ideia de me compara a alguém, alguém com os seus próprios traumas, falhas e talentos é por si só ridícula e autodestrutiva.

Não estou a dizer que nunca mais me vou sentir insegura perto de uma rapariga que pareça ultrapassar-me em tudo mas penso que depois de conhecer a Lua, depois de conhecer a rapariga de carne e osso por detrás da máscara de perfeição, não me vou lembrar dela como a deusa bidimensional e inexistente do primeiro dia de aulas mas sim como a rapariga doce, insegura e amorosa daquela tarde de Verão em que percebi que não estou sozinha no mundo.
*Todos os nomes foram alterados para proteger os inocentes, especialmente a minha pessoa.

                                                                               

                                                                   Verónica

sábado, 10 de março de 2012

A Lírica Camoniana

Um pouco de Luís Vaz de Camões...

    Camões, um poeta celebre da nossa sociedade, deixa-nos confusos acerca da sua vida. Sabe-se, porém, que nasceu a 1524 ou 1525 e morreu a 10 de Junho de 1580. Ao longo da sua vida escreveu várias obras, entre as quais, destacamos a lírica.
    A Lírica Camoniana destaca-se pelo seu tema predominante, o Amor ("Amor é..."). No entanto, este não é o único tema, salientam-se também o desconcerto ou o absurdo ("Tanto do meu estado me acho incerto..."). Quanto à forma, Camões usou as redondilhas como marca da sua Lírica (De que me serve fugir / da morte, dor e perigo / se me eu levo comigo..."). Existem duas redondilhas, a maior e a menor, a redondilha maior são versos de sete sílabas métricas ou heptassílabos e a redondilha menor são versos de cinco sílabas métricas ou pentassílabos, a isto designamos por medida velha ( "Quem ora soubesse / onde o Amor nasce / que o semiasse! ...").
    Na verdade, a maioria das composições adotaram a medida nova, que foi introduzida em Portugal, a partir do século XVI. A medida nova corresponde ao verso dez das sílabas métricas ou decassílabos. Esta medida foi utilizada em composições de um nível mais avançado que as redondilhas, por exemplo, nas oitavas, nas sextinas, nas elegias, mas sobretudo nos sonetos (" Grão tempo há já que soube da Ventura..."). O soneto é constituido por duas quadras e dois tercetos, nesta ordem e todos decassilábicos. Normalmente, o soneto termina com a chave de ouro, que é a conclusão do poema.
    Em suma, a Lírica Camoniana é influenciada pela época classica, tornando-se assim Camoes um escritor do classicismo. Podemos ainda dizer que Camões se tornou célebre devido a obra " Os Lusíadas", que narra os grandes feitos portugueses. Sem dúvida um grande escritor! 

Lola  Rosseu

sexta-feira, 9 de março de 2012

Para que serve a Cultura


Um pouco de Filosofia...

    A palavra cultura tem dois significados, dependendo sempre do contexto. Por exemplo se estivermos a falar de um país, nós dizemos que esse país tem uma cultura diferente da nossa, então neste contexto cultura refere-se a tradições, hábitos e crenças. No entanto, se dissermos que um homem tem muita cultura, este contexto é diferente do acima referido. Neste contexto, cultura refere-se àquilo que a pessoa sabe, acerca de todo e qualquer aspeto.
   Para responder à pergunta “Para que serve a cultura?” vou focar-me na cultura de uma pessoa. Cada pessoa tem a sua própria cultura, a sua forma de pensar e a sua sabedoria acerca do mundo, a chamada cultura geral. Estes aspectos são importantes, porque é o que nos diferencia uns dos outros. Se todos soubéssemos as mesmas coisas, tivéssemos os mesmos gostos, todos seríamos iguais e teríamos a mesma profissão e faríamos as mesmas coisas. É por causa ou graças à cultura que existem cargos de maior responsabilidade e cargos de menor responsabilidade, cargos de maior conhecimento e de menor conhecimento. Outro argumento que podemos utilizar para dizer que a cultura de uma pessoa é importante, é o facto de esta permitir que nós, enquanto seres humanos, construamos o nosso conhecimento, a nossa forma de agir e de pensar.
   No entanto, todos estes aspetos estão intimamente ligados com a cultura de um país. Se pensarmos um pouco, conseguimos perceber que ao longo da nossa vida nós somos influenciados pela cultura do nosso país. Desde que nascemos até que morremos, vivemos em convivência com a cultura do nosso país e esta é que nos ajuda a crescer.
   Para concluir, podemos dizer que a cultura serve para nos diferenciar enquanto povo, para nos formar enquanto pessoas e para nos distinguir em termos de cargos de alta ou baixa categoria. Como disse Vitorino Nemésio (escritor, poeta) “Cultura é tudo e tudo é Cultura”, basta ter olhos para ver, ouvidos para ouvir, mas sobretudo estar atento e observar o mundo à nossa volta. Se assim o fizermos o nosso conhecimento aumentará e teremos a possibilidade de ser aquilo que por vezes sonhamos ser.
 Lola Rosseu

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Novas páginas!

        Surgiu a iniciativa de criar mais duas páginas no nosso blogue-Caixa de Pandora e Pontos de Vista. A primeira consiste na divulgação de livros, escritores e assuntos relacionados e ficará a cargo da cronista Adoriabelle. A segunda será uma página de textos sobre determinados assuntos, cuja finalidade é refletir ou ficar a conhecer diferentes opiniões acerca de determinados temas, à escolha. Esta página ficará a cargo da Anita P.P., mas é aberta às outras cronistas que tenham textos que possam ser inseridos nestes parâmetros. Como estas páginas não podem ser comentadas, pedimos que, caso queiram fazer sugestões ou comentários a algum texto, os façam no chat ou na última publicação das respetivas cronistas, na página principal.

Cartas Perdidas

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Verónica

Ela vive dentro de mim
em sombras escondida
misteriosa é, assim
a minha amiga mais querida.


Ela esconde-se em véus
de desespero e amargura,
faz quebrar os céus
nessa doce tortura.


Ela a todos detesta 
sarcástica e cruel
Não existe bondade nesta
e no seu coração de vinagre e fel


E a sua sede de morte
eu tento conter
E a minha triste sorte
é ser eu a sofrer


Não sei de onde veio
porque me veio assombrar
mas sem este doce devaneio
não podia prosperar


E é com amor
que ela olha por mim
que me provoca a dor
que me liberta por fim


E, incrivelmente, só o seu nome sei
Um nome que nada significa, um nome que inventei
Será sempre parte minha
e nunca a conhecerei
                                                                                                                             Verónica

sábado, 25 de fevereiro de 2012

NOS BRAÇOS DE UM ANJO…



Capítulo II – E quando menos esperamos que algo nos aconteça…

- E basicamente o que passou foi isto, tal como eu te contei…
- Mas… porquê?
- Porquê o quê?!
- Explica-me, por favor, qual o motivo para, neste momento, estarmos a perder tempo com alguém que não merece nenhuma da nossa atenção?
- Não, pois, quer se dizer… - respondera Raquel, muito atrapalhada – eu apenas te descrevi aquilo que observei. Sabias que ela é perigosa? Por acaso sabias que ela já esteve presa?
- É obvio que sabia tudo isso e muito mais, aliás, na altura em que tu e o Tiago terminaram a relação, eras tu própria que fazias questão de me manter informada acerca da vida da… pobrezita. Mas, recordas-te há quanto tempo isso já foi? Tens consciência das voltas que a tua vida deu, depois desse desastroso incidente?
- Eu sei – exclamara desalentadamente, Raquel – mas, ouve-me Luísa, eu nunca mais toquei neste assunto, uma vez que nunca mais os encontrei juntos, logo pensei que ele já se tivesse deixado desses vícios, porém…
- Espera! – Interrompeu aquela que sempre fora a melhor amiga de Raquel e que por isso tinha noção de todas as ocorrências da sua vida – Eu já percebi o que se anda a passar…
- Ah?!
- Sim, tu, tu… andas a segui-lo!
- Não, não! Eu era incapaz! Desde aquela infeliz tarde em que o encontrei sentado ao lado de outra, que nunca mais lhe dirigi a palavra.
- Então como sabes que eles os dois nunca mais estiveram juntos? Eu já te conheço muito bem e não digas que não eras capaz de tal feito porque eras, não me tentes enganar!
- Ai, estou tão confusa! Eu não o segui, vi-o algumas vezes na rua enquanto caminhava, sem querer, claro, acontecia… Estas coisas acontecem…
- Pois, pois… O que foi, que cara é essa, Rquelzinha?
- Olha, tu sabes o que é que eu penso de tudo isto?
- Até tenho medo de saber…
- Oh! Eu acho que devia ajudá-lo! – Afirmara Raquel, muito determinada.
- Tu nem penses! Vais ajudar uma pessoa que só te fez sofrer, que provavelmente nunca te amou de verdade?...
- Ele está sozinho, não tem família nem muito menos amigos que o apoiem, que o ajudem a vencer as dificuldades da vida.
- Então porque não pede ajuda à sua amante querida e adorada com quem ele te traiu?
Luísa apercebera-se de que estas não foram as palavras mais indicadas:
- Oh, pronto amiga, eu agora só quero que te concentres no lindo casamento que realizar-se-á daqui a dois meses, do qual eu tenho o enorme prazer de ser a madrinha! Já viste que o dia tão desejado está quase a chegar, finalmente vais-te casar!!!
- É… - Raquel encontrava-se realmente desanimada.
- E também, nunca serias feliz à beira daquele pobretanas, enquanto que o Filipe sabe como te proporcionar a verdadeira felicidade, fundamentalmente, a nível económico. Ah pois, quando te casares nem vais precisar mais de trabalhar!
-Mas será que tudo na tua vida é dinheiro? O que é para ti viver? Estar rodeada de dinheiro? Não há valores?
- Então Raquel, controla-te! Eu… não era minha intenção dizer tal barbaridade…
- Mas disseste…
- Tens toda a razão. Desculpa-me! Agora vamos esquecer todos os problemas. Acaba de tomar o café e vamos ter com a Cláudia à nova loja que abriu, ouvi dizer que tem vestidos lindíssimos para meninas das alianças…
- Eu acho melhor ir para casa descansar um pouco.
- Raquel, nós combinamos que íamos reservar esta tarde só para atividades relacionadas com o teu casamento. Queres que desmarque tudo, assim, à última da hora?!
- Sim! – Asseverou Raquel, muito convicta de si mesma.
- Não posso!
- Então arranja maneira de puderes!
Sem dúvida, as palavras de Raquel para aquela que sempre a amparara nos obstáculos da sua vida, tinham sido duras e agressivas e Raquel apercebera-se disso no instante em que olhara em seu redor e verificara o cenário que criara. Todos os clientes do café a visualizavam, estupefactos, uns um pouco aturdidos, outros preocupados mas sem coragem suficiente para interrogar sobre o que se acabara de suceder, e havia até quem fizesse troça e, comparando aquele momento a uma peça de teatro, ansiavam por descobrir o final daquele trama. Mas mesmo assim, nada fazia com que Raquel se arrependesse, porém, a vergonha superara toda a fúria e, exaltada, segurou na sua mala e abandonou aquele local, deixando para trás um pedido de espera de Luísa.
- Não tenho paciência para estas situações – murmurou para com os seus botões.
Entrou no seu novo carro, oferecido pelo seu futuro noivo e, sem olhar a meios, conduziu como nunca conduzira até então. Dentro da sua cabeça surgiam diversos pensamentos, no entanto, todos eles se interligavam num único ponto: o Tiago. Já se passara um ano desde o momento que arrasara Raquel mas, incompreensivelmente, esta nunca o esquecera e, ao contrário da imagem que tentara passar perante os outros, o seu amor por Tiago ia aumentando mais e mais. Ele desempenhava um marco importantíssimo na sua vida, era como um anjo, que nunca poderia ser simplesmente apagado, ou talvez podia mas, estranhamente, Raquel não o queria e sofria em segredo, no entanto para ela essa fase estava terminada! Raquel estava disposta a perdoar Tiago e reviver os bons tempos do passado, nem que para isso tivesse de desmarcar o casamento a que fora praticamente forçada e assim recomeçar uma nova etapa na sua vida.
Determinada, a rapariga, enquanto conduzia, segurou no seu telemóvel. Marcou o número de Tiago, com a intenção de que este o atendesse e que desta forma resolvessem todos os problemas existentes entre o ex casal. Porém, por algum motivo, este não o atendera e ela não desistia, esperançada por um futuro carregado de otimas novidades. Raquel estava abstraída do mundo à sua volta, apenas se focava naquele que, na sua opinião, era o único fator que alguma vez lhe tinha dado motivos para viver, até que ouviu um estrondo:
- OUTRA VEZ NÃO!
 Atarantada, saiu do carro o mais depressa que pode. Dezenas de buzinadelas surgiam de condutores impacientes. No chão, encontrava-se o corpo de um homem. Raquel aproximou-se do sujeito e, em pânico, sem saber o que fazer, apenas gritava:
- O senhor está bem? O senhor está bem? Consegue-me ouvir? Diga alguma coisa, por favor!
O jovem fez um esforço e deu meia volta, posicionando-se com a cabeça para cima. Raquel não queria acreditar no que os seus olhos contemplavam:
- Tiago?! Oh…

                                                                                                                                                    Sunshine

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Um pedido de desculpas


Caros Leitores, algumas das cronicas não tem publicado os seus textos, pois a sua situação pessoal no momento não é a melhor. Pedimos imensas desculpas e pedimos ainda que compreendam. No entanto, assim que tudo estiver favorável, voltaremos a postar textos com muita frequencia.
 Desculpem...



Lola Rosseu

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

O Ódio
















Sentimento estranho este,
Que corrompe a mente
E destrói a máquina da vida,
Sem deixar chaga para curar.

Distorce o pensamento
E pinta de preto tudo
O que de bom e feliz
Encontra pelo caminho.

Provoca desastres
E faz mudar o mundo
Com o poder divino
De algo que se sente.

Quem inventou, então,
Tão forte poder
Que consegue derrubar
Até a própria natureza?

Talvez as lágrimas que vejo
Sejam não espelho de Ódio,
Mas sim de esperança e fé
De que o Amor vença a guerra.

Porque quem inventou o Ódio,
Inventou também,
Em perfeito equilíbrio,
O outro lado da moeda,

Na esperança de que, um dia,
Se fundam e governem
Com os sonhos de um
E a realidade do outro.


Anita P.P.

Nova iniciativa!

Como diz o outro: não há duas sem três, mas nós dizemos: não há uma sem duas. Por isso mesmo apresentamos outra iniciativa para os nossos leitores.
O blog decidiu a pedido de uma leitora, começar a escrever poesia! O que acham? Interessante, não?
Deste modo, iremos ter, já a seguir, o primeiro poema e quem escreveu foi a nossa cronista AnitaP. P..
Não percam!

Cartas Perdidas

sábado, 21 de janeiro de 2012

Os insectos cinzentos


Capitulo III- 2ªparte

E depois foi a minha vez, depois da borboleta monarca e da viúva negra chega a vez do insecto cinzento.
-E esta é a nossa filha adoptada, a Joana. – a frase é dita na total ausência de um sorriso. A D.Sara acena, o marido continua a beber.
A festa continuou, a D.Sara falou com a Joana acerca do colégio porque tem um filho com a idade dela que também lá anda e gostava de saber se ela o conhece.
Eu fui para a casa de banho, não para a casa de banho de serviço mas para a do piso de cima.
Vi-me ao espelho e de repente odiei tudo acerca de mim, apercebi-me das minhas borbulhas. Quando me imagino, nunca me imagino com borbulhas e imagino-me leve e ágil, quase sem corpo. Mas não é assim que sou, sou gorda, tenho acne, tronco em forma de barril, peito liso e um cabelo castanho desgrenhado, sem ser liso nem ondulado. Deslizei as mãos para as borbulhas do meu peito quando ouvi alguém bater á porta.
-Joana, estás aí?- a voz era rouca, masculina e hesitante. Era o Rui.
-Estiveste a chorar?- só na altura me apercebi que tinha lágrimas a escorrer-me pela cara.
-Sim.
-Porquê?
-É uma coisa parva, esquece. – Respondi enquanto limpava a cara ao casaco – Preciso que me passes uma justificação para hoje.
O Rui não fez perguntas, nunca faz, limita-se a acenar. Reparei no copo na mão dele, estava bêbado, qualquer dia está igual ao meu pai. Durante algum tempo nenhum de nós disse nada, fica-mos ali, a olhar um para o outro com as vozes e os risos como banda sonora. O Rui é…
Bem, não há maneira de ser delicada em relação a isto, ele é o homem que dorme com a minha mãe.
Eu sei, é estranho. Seria ainda mais estranho se o conhecesses.
O Rui é alto e deve ter sido magro em novo mas recentemente ganhou uma barriga de cerveja, tem o cabelo encaracolado e preto muito curto e óculos rectangulares.
Não é um homem feio, mas não é homem para a minha mãe. Já para não dizer que deve ser uns cinco anos mais novo que ela. Cinco anos não é muito tempo mas a minha mãe e o Rui são, visivelmente, duas pessoas em estados de vida completamente diferentes. Um solteiro e uma mulher de família, um médico e um executiva, um excêntrico e uma beleza, um homem em inicio de carreira e uma mulher que chegou ao topo.
A minha mãe, Isabel, cresceu na parte mais cara da nossa cidade, é filha única de um casal abastado e elitista e frequentou o mesmo colégio privado que nós, um dos mais prestigiados do país. O Rui passou os primeiros anos da sua vida num prédio cosmopolita, a ler os livros de medicina da biblioteca do pai e a dissecar pequenos animais. Quando tinha dez anos, os pais conseguiram a muito sacrifício, inscrevê-lo no nosso colégio. No terceiro dia de aulas viu a Isabel (esta história foi-me relatada por ele, se bem que numa versão muito mais metódica e abreviada, porque o próprio Rui é assim). Era a rapariga mais bonita que já tinha visto, tinha o cabelo loiro e macio como seda e um rosto com a serenidade e a regularidade do das estátuas gregas. Os olhos eram azuis e transmitiam… Bem, não transmitiam nada, eram vazios e translúcidos, como a água. Usava um vestido de alças, branco e rendado que contrastava com a pele sardenta e morena. Durante algum tempo, ele limitou-se a ficar ali parado, a observar a maneira como a boca dela se mexia quando falava, como o cabelo dela lhe roçava no ombro. Ele nunca se tinha apaixonado, sempre pensara que era demasiado racional para isso e a mãe dizia-lhe que ainda era muito novo. Passou os dois anos seguintes a observá-la de longe, era uma rapariga popular, como alguém assim tinha de ser e raramente se encontrava sem namorado. Não era muito inteligente, pelo menos não era o tipo de inteligência que lhe garantisse boas notas. Era uma esperteza, uma sabedoria de viver, um certo carisma, algo especial, algo só dela, algo tão leve como o nome…
Era Isabel.
E era o último ano dela na escola, era agora ou nunca, por isso, um dia, estava a ela a estudar com as outras amigas, envergonhada pela sua falta de perícia nos estudos (pois não estava, claramente, habituada a ser má em alguma coisa), ele falou com ela.
A matéria que ela estudava era, para ele, tão fácil como uma brincadeira infantil. E Isabel deixou-o explicar, divertida por aquele génio em miniatura, que tentava, de uma maneira tão desajeitada que se tornava amorosa, interessá-la nele.
A partir desse dia, Rui começou a dar explicações a Isabel. Raramente falavam de algo a não ser da matéria pois não tinham, realmente, nada em comum, mas havia alguma coisa, uma proximidade, um toque, uma piada ocasional que denunciava a cumplicidade que ia crescendo entre eles. No último dia de explicações, apenas porque não tinha nada a perder, ele beijou-a. Ao contrário do que estava á espera, ela não ficou chocada. Limitou-se a rir.
O Rui diz que foi o momento mais humilhante da vida dele, quando ela se riu. Mas só durou um segundo antes de ela o beijar de volta.
E foi a última vez que a viu em doze anos.
Quando tinha vinte e quatro anos houve uma conferência em Nova York, dada por um investigador que conhecia e admirava. Rui começara recentemente a trabalhar, precisava de uma pausa dos horários esclavagistas e do muco dos pacientes. Queria seguir psiquiatria mas tinha que passar pelo internato primeiro…
Precisava de uma pausa.
Foi então que a viu, tão bonita como sempre, ou até mais se possível, a passagem dos anos definira-lhe as maçãs do rosto e o corpo ganhara formas mais femininas.
Não sei o que aconteceu a seguir, o Rui poupou-me aos detalhes. Mas facto comprovado é o de eles terem passado os dois dias seguintes num quarto de hotel em Nova York.
Na manhã de segunda-feira, Isabel estava vestida e pronta para sair quando se inclinou para ele e lhe deu um beijo. E foi com um sorriso nos lábios e uma voz doce que lhe disse:
-Sou casada.
E, bem, catorze anos depois, aqui estamos nós. Quase exactamente na mesma.
-Não respondes-te á minha pergunta. Porque estás a chorar? – sente-se o cheiro do álcool cada vez que ele fala.
Ele não está a tentar pressionar-me, nem meter-se na minha vida, está só preocupado comigo.
-Tive um dia mau na escola e depois houve esta… O que é esta merda afinal? Uma festa, um jantar de negócios, um banquete romano?
-Sabes que não gosto de te ouvir falar assim.
Não me controlei, bati-lhe. Bati-lhe e depois abracei-o com tanta força quanto conseguia, como se ele fosse o universo e realidade que parece escapar-me cada vez mais. O Rui não reagiu imediatamente, não está habituado a contacto físico, mesmo quando está com a minha mãe limita-se a olhar para ela como se fosse o sol, nunca toma a iniciativa de lhe tocar. Mas depois de algum tempo ele abraça-me de volta e toca-me no cabelo, como nunca o vi fazer á minha mãe, como nunca o vi fazer a ninguém.
Não sei bem explicar o que aconteceu a seguir, só sei que o beijei. Meu deus, até tu que és um insecto me estás a olhar com desprezo. Não foi de propósito, pelo menos não fui eu, a Joana que o fiz. Foi aquela parte de mim, aquela que quer magoar a minha mãe, que não quer mais nada no mundo do que fazê-la sofrer.
Foi ela que o beijou e que fez…
Bem, tudo aquilo que veio a seguir.


                                                                                                                      Verónica

Os insectos cinzentos



Capitulo III – 1ªPARTE

Joana

De que cobra gostas mais?
A minha favorita é a real da Califórnia mas ela hoje não se mexe, está enrolada á volta do pote de água com uma expressão triste nos olhos negros. Os animais também ficam tristes, sabiam?
Até as cobras, não são tão más como as pintam, as cobras… Lá porque não são fofinhas e quentes não quer dizer que mereçam ouvir o seu nome a ser usado como termo pejorativo a humanos que são tão inferiores a elas.
Voltei a faltar às aulas, não faz mal de qualquer maneira, o Rui arranja-me um atestado.
Ontem fui, era segunda-feira e o jardim zoológico estava fechado, também podia ter ido ao cinema mas não tinha dinheiro e não estava a dar nada de jeito…
A professora de francês ergueu logo uma sobrancelha quando me viu, não tinha o uniforme vestido e devia parecer que não dormia há dois dias. O que até é verdade, ando a tentar ler a obra completa do Marquês do Sade e não é propriamente uma leitura que possa fazer á frente de toda a gente…
-Menina Joana, ouvi dizer que esteve doente? – o sarcasmo era desnecessário, ela sabe que não estou doente. Tudo bem que a baixa é psiquiátrica mas ela não acha que eu seja maluca, só uma falhada intransigente e mimada. Pode ter razão, não sei, mas para dizer a verdade, não me interessa.
-Sim.
-Já ultrapassou a sua fobia á escola? - nesse momento todos os meus colegas se começam a rir, olho para o Luís que é o que está mais próximo de mim com o ar mais inexpressivo que consigo arranjar, até que o obrigo a desviar o olhar.
Sem mudar a expressão respondo á pergunta da professora:
-Não particularmente.
Depois foi o mesmo de sempre, uma conversa numa língua que não compreendo e risos de gente que percebia tanto como eu mas achou que se devia rir. Não sei porque deixo estas coisas incomodarem-me mas quando dei por ela tinha lágrimas nos olhos, não volto lá enquanto me lembrar disso, não volto mesmo. Ao almoço sentei-me á beira da Susana e da Anabela e embora elas não se tivessem ido embora continuaram a falar uma com a outra e excluíram-me completamente da conversa. Queria falar com elas mas não consegui, não conseguia pensar em nada para dizer, foi então que se apoderou de mim aquela sensação. Nada é pior do que não existir e ali, sozinha mas consciente, incapaz de pensar foi isso que eu senti. Já pensei nisso muitas vezes, e se eu sou só uma estrela ou um objecto inanimado a observar a vida dos outros, incapaz de ter a minha própria vida? Às vezes, quando a minha mente escapa para uma música ou um filme, pergunto-me se não serei só mais um personagem. Por vezes acho que seria tão mais simples ser um animal. Teria sempre um objectivo: sobreviver, reproduzir-me, arranjar comida.
De qualquer modo, porque quererias tu ouvir as minhas crises existenciais?
És só um insecto. Um insecto cinzento.
Hemiptera Pentatomidae, um insecto comum, uma praga agrícola. Não és bonito como as borboletas monarcas, nem tens o mistério e glamour das viúvas negras, nem sequer o perigo dos escorpiões. És só mais um, um entre muitos. É por isso que falo contigo, sei que tu percebes, tu és, no reino dos insectos, o equivalente àquilo que eu sou no dos humanos.
Um nada.
De qualquer maneira, tenho de contar isto a alguém ou não aguento.
Ontem á noite houve mais um jantar. O Rui também veio, vagueando pela sala com aquele ar estranho, tão típico dos psiquiatras. Uma das convidadas foi uma colega de trabalho da minha mãe, uma senhora de meia-idade, muito bem arranjada de mão dada com um marido corado que não tirava os olhos do decote da mãe e, posteriormente, do rabo da Sandra.
-Este é o meu filho, o Miguel. Miguel, esta é a Sara, está encarregue das contratações. E este é o José, o marido dela.
O meu irmão, com o seu ar de permanente aborrecimento levanta-se da cadeira e cumprimenta o casal.
-Prazer em conhecer-te, que belo rapaz que tu és. – a mãe lança ao Miguel um olhar de censura pois ele mal consegue conter o riso.
-E a minha filha, Sandra. – A mãe pode achar que esconde bem as preferências dela, mas o facto de a Sandra ser a sua favorita é perceptível. É perceptível nos seus olhos, na sua voz e até na extensão do seu sorriso – A Sandra está no quadro de honra, tem média de 19. É provável que entre para medicina.
Os cumprimentos com a Sandra também foram bastante mais efusivos do que os do Miguel, a D.Sara pareceu genuinamente impressionada e o marido dela só não apalpou a Sandra porque a sala estava cheia de gente.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Quando a chuva passar

A nossa relação começou como qualquer outra. Deixei de contar o tempo ao longo dos anos porque, a certa altura, já não fazia sentido. Mas lembro-me muito bem do medo que tinha, no princípio, de que te fosses embora. Afinal, nunca tive grande auto-estima. Gozaste muito comigo sobre isso, mas no final nunca me deixaste. Estiveste sempre lá para mim. E eu fui muito feliz.
         Infelizmente, chegou o dia em que descobri que algo tinha mudado. Onde estava a minha felicidade? O que julguei ser um dia mau, tornou-se em semanas e eu não parava de pensar no que tinha acontecido. Éramos as mesmas pessoas, certo? Talvez não. Havia algo de errado. Mas tu também o percebeste e tanto pensaste que te tornaste distante e te começaste a esquecer de ouvir as minhas preocupações banais. Depois, começamos a discutir, porque estávamos sempre em desacordo. Eu estava triste e tu estavas sempre chateado por tudo e por nada.
         Um dia, chegaste a casa mais cedo do que o costume. Eu estava a trabalhar na sala e fiquei bastante surpreendida, porque sempre adoraste o teu trabalho e conseguias dividir muito bem o tempo, de forma a sair do trabalho às horas certas para poderes estar em casa quando eu também estivesse.
-         Vou-me embora.
Não disse nada. Tentei arranjar qualquer outro significado escondido nas tuas palavras e não encontrei. Tu continuaste a olhar para mim durante alguns segundos e foste para o quarto. Só então percebi que me ias realmente deixar. Não havia qualquer tipo de expressão em ti para além da determinação de cumprir a decisão tomada e por isso, em vez de gritar contigo e desatar a chorar, fui ajudar-te a arrumar as coisas. Chorar não ia mudar nada. Não te ia fazer ficar.
No dia seguinte já tinhas as malas com o que era necessário para os primeiros tempos. Disseste que virias buscar o resto quando arranjasses um sítio mais permanente para ficar. Concordei com tudo. Estava demasiado concentrada em manter a compostura para discutir. Foste pôr as tuas coisas no carro e eu olhei para a nossa casa. Era demasiado grande para eu lá viver sozinha. Teria de arranjar outra.
-         Eu volto.
Não tinha reparado que tinhas voltado e assustei-me. Estavas com aquele ar de quem percebeu os meus pensamentos. Acenei. Havia esperança. Talvez um dia voltasses.
         Acenaste uma última vez de dentro do carro para o alpendre e eu acenei de volta. Tentei absorver cada segundo, para nunca mais me esquecer de ti. O teu pé pisou o acelerador e eu segui o carro com o olhar até que desapareceu, no fim da rua.
Nesse dia, prometi a mim mesma que ia esperar por ti. Decidi ter esperança nas tuas palavras. Ao longo do tempo, esquecemo-nos do que nos fazia felizes e esta era a nossa oportunidade de o relembrar. Se nunca mais voltasses, pelo menos teria esse conhecimento, para não voltar a cometer o erro de esquecer. Se decidisses que eu não te fazia feliz, aprenderia a viver assim e apenas te desejaria o melhor.
Mas voltaste e nenhum de nós voltou a esquecer a felicidade.


Anita P.P.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Os insectos cinzentos


Capitulo II- Parte 2
Não era como nos filmes, ninguém estava a gritar em conjunto e no entanto estava uma barulheira infernal. Um pouco contra a minha vontade, dei por mim junto deles a ver aquela cena degradante e ridícula.
Para começar, era ridícula porque claramente um daqueles rapazes nunca andara á luta, estava a ser assassinado pelo outro que lhe batia com toda a força que tinha. No entanto parecia ter quase medo de usar toda a sua força para lhe bater. Não que se a usasse fosse ganhar a luta, era magro, pequeno e tinha cara de bebé apesar de, a julgar pela barba já ter mais de quinze anos, mas pelo menos podia não ter sido tão massacrado. Já tinha o rosto cheio de sangue e o nariz tinha um ângulo estranho.
Aquelas pessoas eram todas tão feias, os seus rostos eram tão disformes, as suas vozes tão agudas.
No meio da multidão, era uma loira oxigenada com um peito grande e uma cara tão feia como todas as outras quem olhava mais fascinada para a cena.
A Vera, naturalmente.
Só depois reconheci que o rapaz que estava a espancar o outro era o namorado dela. Ou um derivado, estão sempre a separar-se mas o desgraçado é tão masoquista que acaba sempre voltar para ela mesmo estando farto de saber que ela é uma cabra que não se importa de o trair com qualquer um.
Alguns funcionários tentaram separá-los mas foi só quando o director chegou que a multidão realmente se dispersou.
Aproximei-me da Vera, não fui a única, ela estava rodeada de gente mas quando me viu fez uma cara muito horrorizada do género “viste aquilo?”.
-O que é que se passou, porque é que o Tiago estava a bater naquele puto? – ao falar apercebi-me da estranheza da minha voz, mas a Vera não parecia reparar.
Outro olhar falsamente horrorizado antes de dizer:
-Foi por causa de mim, acreditas? Bateu no puto só por causa de mim!
Eu retribuo o olhar horrorizado:
-Tens de o largar de vez, não pode ser assim, mas quem pensa ele que é, o teu dono?
Bla, bla, bla, és cá uma cabra de merda, detesto-te e és feia. Não costumas ser mas hoje estás, o teu nariz é demasiado grande e tens borbulhas, imensas borbulhas e poros dilatados
Bla, bla , bla, as pessoas sempre foram assim tão barulhentas? Porque é que estou na sala em que tenho biologia?
O que está acontecer?
Está tudo a rodar tão depressa, mas não pode ser porque estou parada, não pode ser pois não, mãe?
Por favor, ajuda-me, eles estão a puxar-me a levar-me até ao fundo, não consigo mexer-me, não tenho braços nem pernas, não consigo senti-los! Não te rias, odeio-te, odeio-te, odeio-te!
-Sandra, Sandra estás bem?
Tenho de ir, tenho de fugir, eles vão apanhar-me, não está bem, não estou bem, aqui, eu. O meu x-acto, quero apunhalá-los mas os meus braços estão no chão
Não, afastem-se de mim, estou a tentar, estou a tentar agarra-lo, consegui, sai da minha frente, sai, sai!
Porquê está tudo vermelho, estou magoada, não me sinto magoada!
E se estiver morta? O que se passa eu não consigo…
Onde estou eu?          
                                                                                                                                  Verónica

Os insectos cinzentos



Capítulo II- Parte 1

Sandra

-Enfiada na biblioteca outra vez. – o Bruno contrai o nariz e sorri.
Não lhe respondo, de facto nem tiro a cabeça de dentro do livro de matemática. Ele muda radicalmente de expressão e apercebo-me que deixou de esperar uma resposta.
-Só te queria perguntar se queres aparecer hoje á noite na praia.- limito-me a abanar a cabeça- Já almoças-te?
Agora sim tiro os olhos do livro e fixo-os nele:
-Agora és meu pai?
-Só estou preocupado contigo.
-Devias preocupar-te menos comigo e mais contigo porque no ano passado tiveste média de 13.
-Sabes que mais, vai-te foder, não tenho paciência para te aturar!
O Bruno não é mau rapaz, na verdade é mais o contrário, é meu namorado há uns meses e não vai durar muito, não é muito bonito nem muito inteligente e é demasiado simpático para mim.
A verdade é que tenho fome, é por isso que estou a ser uma cabra com toda a gente é por isso que tenho a cara enfiada num livro de matemática, porque se for á cantina sou obrigada a olhar para montes de gente feliz e sorridente a comer batatas fritas e bolos quando eu não como desde ontem.
Acabo por desistir porque não consigo pensar e vou para a casa de banho. No outro dia encontrei um comprimido estranho no casaco do meu irmão, é mais uma cápsula do que um comprimido, sei que muitos miúdos da escola dele se drogam e não me parece que ele seja desse tipo mas, para evitar que ele se metesse em sarilhos fiquei com ele. Ainda pensei em dizer á mãe mas a verdade é que não quero que os meus irmãos me odeiem. O que é patético. Mas quando eles eram pequenos costumava-mos ser tão próximos. Ainda me lembro da Joana ser adoptada, eu tinha sete anos e o Miguel tinha três. Era tão pequena e bonita, com os olhos verdes escuros como as árvores. Prometi a mim mesma que faria tudo o que pudesse para a proteger, que nunca deixaria que ninguém lhe fizesse mal.
Mas depois eles cresceram e deixaram de confiar em mim e de seguir os meus concelhos e aproximaram-se um do outro enquanto eu fiquei sozinha. E agora posso ver o ódio nos olhos deles, a Joana tornou-se numa renegada deprimida e estranha e o Miguel num miúdo desligado e médio em todos os sentidos, sem nunca se destacar em nada.
Por isso quando vi o comprimido só o imaginei a olhar-me daquela maneira e decidi que a mãe provavelmente também não conseguiria resolver o assunto, anda demasiado ocupada com o Rui. Decidi ficar com ele e quando vinha para a escola reparei que ainda o tinha no bolso.
E ali estava eu, na casa de banho, pronta para passar de estudar matemática na hora de almoço para engolir uma cápsula estranha na casa de banho quando me dei conta da incrível estupidez do que estava prestes a fazer, tinha aula a seguir e iam descobrir imediatamente que eu estava pedrada. Já tinha engolido o comprimido, mas não sentia nada, talvez estivesse tudo bem, talvez fosse só um comprimido para a cabeça ou assim…
Fiquei ali algum tempo até ouvir alguém bater á porta.
-Estás bem? -só nessa altura me apercebi que estava a chorar e a soluçar alto.
Limpei a cara e abri a porta, uma aluna do décimo-primeiro ano olhava para mim com um ar genuinamente preocupado.
Sai da casa de banho a correr mas não sem antes assegurar á rapariga que estava tudo bem.
Sei que nem vale a pena pedir desculpa ao Bruno, aquilo já deu o que tinha a dar.
A caminho da sala apercebi-me de que estava tonta e parei.
Estavam dois rapazes a lutar na entrada enquanto uma multidão de adolescentes excitados pelo sangue e pela violência observavam e murmuravam euforicamente.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Nos Braços de um Anjo...


E tudo o que damos por garantido por vezes acaba, por muito que não queiramos.
Tiago nunca teve realmente uma família. A mãe morreu logo depois de o dar à luz e o pai teve a preocupação de o educar e de lhe dar uma boa instrução até aos 18 anos. Depois disso, foi embora para o Brasil com a sua amada. Em consequência disso, Tiago sempre foi uma pessoa muito revoltada e que gostava de correr riscos.
Raquel queria atingir a felicidade junto dos que amava. No entanto, não o conseguiu, pois certo dia ia Raquel e o seu irmão a passear de carro quando Raquel perdeu o controlo deste causando-se um acidente…Raquel escapou quase ilesa, mas o seu irmão acabou por falecer. A partir desse dia, Raquel perdeu o contacto com a sua família.
Foi neste momento difícil da sua vida que Raquel conheceu Tiago! Desde aí que se apaixonaram um pelo outro, ou pelo menos era o que Raquel pensava até ao dia em que…
- Qual é a tua? Marcares um encontro comigo e encontro-te com… Desculpe, como se chama? Clara, claro. Que descaramento.
- Raquel! Eu amo-te Ela é só…
- A tua amante? – Completou Raquel a frase de Tiago.
Mais rápida que Tiago foi Clara que respondeu afirmativamente à pergunta de Raquel:
- Sim, sou a amante dele. Talvez não o faça feliz o suficiente, já pensou? É lixado, não é? Sentir que o momento vai chegar, que vai perdê-lo!
- Ele ama-me, não ouviu?
- Querida, nem você acredita nisso.
- Vá, chega senhoras, estamos num restaurante! Vamos para casa Raquel!
- Vamos? Se formos os dois, é para ires buscar as tuas coisinhas e andares da minha casa! Eu amava-te! Foste como um anjo que caiu na minha vida! Eu queria construir família contigo! Sabes o que é isso? Ah, pois, nunca tiveste realmente uma família, não é? – Ato contínuo, ficou arrependida pelo que disse.
- Nem acredito que disseste isso!
- Sinceramente, nem eu! – Dito isto virou costas e foi-se embora. Tiago foi atrás de Raquel, mas logo a seguir estava Clara a impedi-lo.
- Onde pensas que vais? Nem as tuas roupinhas, vais buscar a casa dela! Eu dou-te roupa! Eu tenho dinheiro! Não há problema, querido!
-Mas tu ainda estás aqui? Não é só isso que interessa! Vê se cresces e se arranjas alguém como tu: ambiciosa, fria e sem coração!
Com isto, desatou a correr para fora do restaurante rumo a casa de Raquel…

Adoriabelle